A Pescaria e a Esperança
Fui pescar com meus dois irmãos mais novos, dois brilhantes sobrinhos e outros amigos, apesar de desconhecidos. Na próxima pescaria, certamente apelarei para Simão Pedro ou para o Nazareno me acompanharem para localizarem os cardumes, eis que, depois de dois dias de tentativa, voltei invicto, vale dizer, sem ter fisgado um único lambari ou outro peixe qualquer. Mas não foi minha imperícia de pescador que, eventualmente, não soube fisgar no momento certo. Não. Foi falta de peixe, mesmo. Eu, estático. olhando a ponta da vara, também estática, mas quando se mexia e eu trazia o anzol à tona, supondo ter perdido a isca, era, apenas, enrosco de lodo do fundo do rio. O belo rio Paraná, em Paulicéia, é de uma beleza estonteante na sua superfície e horizontes, mas, nas suas profundezas, prolifera muito lodo. Uma bela metáfora, né? Parece um conhecido país. Depois de muito me divertir e ser tratado por todos como príncipe - não aquele maquiavélico, voltei a minha cidade natal. Lá vi os dois irmãos mais velhos e outros parentes, que sempre me recebem com carinho especial. Visitei alguns amigos já conhecidos e conheci amigos ainda desconhecidos. Todos me fartaram com gentilezas. Na manhã de meu penúltimo dia de visita, vi as nuvens apocalípticas das fumaças das queimadas a oeste, vindas da Amazônia e dos dois Mato Grossos que, num caminho dantesco, sobrevoaram o estado de São Paulo até sua capital, onde despejaram chuva enegrecida pela poluição. Uma espécie de première do armagedon, Retornando a minha casa, com saudades imensas de minha mulher, liguei a televisão. As primeiras imagens me falaram da tragédia do ônibus capturado por um infeliz desajustado, que nenhuma força policial teve a sabedoria para entender seu quadro patológico, destruindo-o com balas de fuzil disparadas por atiradores de elite, com pontaria certeira, para gáudio de muitos, inclusive do governador daquele estado e do capitão eleito. À noite, vejo no noticiário a intenção e primeiras medidas para a privatização de inúmeras estatais, numa confissão explícita da incapacidade nacional de gestão da coisa pública, buscando um escapismo fácil para encher a burra dos capitais internacionais e nacionais. E a cereja do bolo, a Petrobrás, que coloque as barbas de molho, eis que será a próxima. Nós pagaremos tudo, inclusive os aumentos dos preços dos bens e serviços futuros privatizados. Tudo isso como corolário e resultado de um fantástico golpe planejado e aplicado pelas hienas deste país. Por fim, o capitão eleito e o ministro do meio ambiente discursando denunciam as ONGs sobre a catástrofe ambiental, geradora das nuvens poluídas, ou considerando fake news, como discursos de comunistas. A teoria dos contrários, exposta pelo companheiro Sócrates - o filósofo, em seu último dia de vida, rotulando de comunista, como fez o capitão eleito com esses membros das ONGs, me leva a concluir que os seguidores dessa doutrina e dessas organizações não só são os melhores e mais preocupados cidadãos, como aqueles ainda não cegos deste rincão. Finalmente, juntando todos os acontecimentos dos últimos dias, conclui, também, a maior das metáforas, como corolário de todas as coisas vividas, vistas e ouvidas : poderia ficar incontáveis dias pescando que, não só não pescaria nenhum peixe, mas só lodo do fundo do rio, bem como A ESPERANÇA - O PEIXE MAIOR, também passaria muito distante de meu anzol. Tristeza, apesar da alegria deixada pelo convívio com todos os irmãos, parentes e amigos, nessa minha rápida aventura.