Muito Além da Escola Pública
Só estudei em escola pública, desde o grupo escolar até a Universidade. Por isso, sei da sua importância. Esta geração precisa conhecer melhor a história e seus contornos. E refletir sobre ela. No dia 6 de abril de 1964, 7 dias depois do golpe, foi editada a Lei 4.464, assinada pelo Ministro da Educação, Flávio Suplicy de Lacerda, a mando dos milicos recém entronados. Vejam e reflitam sobre a importância que aqueles militares davam às escolas públicas, como fomentadores da resistência política. As escolas públicas sempre foram o grande celeiro de nossas maiores lideranças políticas. Em todos os tempos. E sempre foram uma voz de protesto e avanço político democrático. Era preciso castrá-las. Segundo a cabeça daqueles militares, e os de hoje, também, alí, na escola pública e nos sindicatos, havia um ninho de cobras peçonhentas. Era preciso esmagá-las. A Lei Suplicy, como ficou conhecida, era decorrente de um acordo MEC-USAID, certamente conduzido pela CIA, que, no contexto da Guerra Fria, visava transformar o ensino público brasileiro crítico num projeto tecnocrático subserviente, silencioso, alinhado, ou, no mínimo, omisso, aos interesses imperialistas dos EUA e do capital estrangeiro em geral. Eu assisti e vivi essas e outras ações com a mesma finalidade. A resistência estudantil sobreviveu até 1968, quando o AI-5 quebrou a espinha desse e de outros movimentos. A partir de 1970, explodiram as escolas privadas, em todos os níveis. Pulularam em todas as esquinas, como botecos. A escola privada nascia para gerar LUCROS, e não para discussões políticas contestatórias. Além disso, a escola privada secularizava um ensino doutrinário de aceitação e nunca de contestação, além de aliviar o compromisso orçamentário público com a educação. Em outras palavras, elitizou-se o ensino e segregou-se a oportunidade de desenvolvimento das classes proletárias, incapazes de arcar com esses custos. Assim, a escola pública deixou o papel de Protagonista, para o papel de Coadjuvante. E os donos dessas escolas privadas de cursinhos e curriculares passaram a se constituir na base do ensino em geral e cabos eleitorais da classe dominante. Nos dias de hoje, a escola privada se constitui em notável segmento forte econômico e financeiro empresarial deste país, É só ver nos jornais, rádios e televisões suas peças publicitárias, na disputa feroz pelo mercado. Suas suntuosas instalações só perdem para alguns templos religiosos e bancos. Nenhuma dessas instituições se preocupa com qualidade, mas sim com o LUCRO, nem perde um minuto de sono por aqueles que não podem pagar para dispor de suas aulas. Assim, quem conhece essa realidade implantada desde 1964, como eu, tem a obrigação de esclarecer a verdadeira história para as gerações posteriores àquele golpe. E reafirmar que a luta pela escola pública, num resgate de sua importância, é uma luta para se libertar de um novo tipo de ESCRAVIDÃO: a seletividade do ensino e a consagração da formação de uma sociedade com CASTAS. A classe dominante não precisa da escola pública. Aliás, é sua inimiga, pois esta não deixa secularizar seu domínio. A luta está, portanto, MUITO ALÉM DA DEFESA DA ESCOLA PÚBLICA. É A LIBERDADE QUE ESTÁ EM JOGO.