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Várias Faces da Miséria

Lembro-me bem dos tempos em que eu frequentava o Centro Velho de São Paulo, na região da Rua Direita, XV de Novembro, São Bento e adjacências. Grande parte desse tempo, foi quando por lá trabalhava. Era comum cruzarmos com os mendigos da região. Alguns eram velhos conhecidos. Cada um deles, ou delas, expunham suas misérias. Uns aleijados de pernas ou braços, outros cegos, outros com corpos deformados e outros, ainda, expunham suas feridas abertas em carnes vivas nas pernas, num cenário dantesco da Idade Média. A primeira reação era desviar o olhar daquela imagem repugnante. Cada um realçava sua miséria, no sentido quase mercadológico de comover os transeuntes, de tal sorte a tentar receber uma moeda de qualquer valor, a ser depositada no sujo prato de metal a sua frente. Nada mudou daquela época até hoje, passados quase 30 anos. Esse é um retrato constantes da miséria urbana, nesta grande cidade, explícita em nossos olhos e impactando nossa alma. Outras misérias desse mesmo calibre estão espalhadas por esta megalópolis e pelo país afora, nas favelas, nas barracas dos sem teto e sem terra, nas moradias dependuradas nos morros, à mercê da primeira grande chuva, nas casas insalubres dos sítios, das fazendas, convivendo com o bicho do "barbeiro" e outros assemelhados. Enfim, o que não falta são exemplos de miséria. Há dias, a sociedade teve mais duas notícias impactantes, que exibiram outras faces da miséria, a de caráter ético e social: o estupro coletivo de uma jovem e a morte de um menino de 10 anos de idade. O primeiro evento ocorreu na "cidade maravilhosa" e o outro num dos bairros chiques de S. Paulo. Ambos os casos, dentre milhares outros rotineiros e cotidianos, mostram uma outra face da miséria humana.Aliás, a miséria humana, como se vê, tem incontáveis faces. Tudo isso aviva minha memória, em termos políticos. Lembro-me bem das críticas que se faziam aos regimes socialistas, na década de 1950 a 1970. Os jornais conservadores brasileiros mostravam fotos de mulheres russas, varrendo as ruas congeladas de Moscou e Leningrado, e consideravam aquilo um absurdo, uma enorme crítica ao sistema socialista sob a ótica humanista. Outra crítica que faziam era pelo fato do Estado Soviético e Cubano tomar as crianças em seus lares e obrigá-las a permanecer nas escolas o dia todo, onde recebiam alimentação, ensino, esportes e, obviamente, doutrinação educativa. Esses regimes socialistas praticaram sempre o regime de Pleno Emprego, onde, obviamente, não há desempregados, e da alfabetização obrigatória. A União Soviética eliminou o analfabetismo em 1940, sob o duro Stalin. Sob os czares, o analfabetismo era de 90%. Em Cuba, já não ha analfabetos e fome há muito tempo. Ninguém pretende resgatar ou ressuscitar o núcleo duro do socialismo soviético, de resto impossível. Nem homologar tudo o que o socialismo cubano fez e faz. Mas, todas essas experiências humanas tems tem um valor maiúsculo. Fico pensando sobre tudo isso, quando vejo essas misérias nas ruas de nossas cidades, nos campos, nas prisões e na imensa multidão de DESEMPREGADOS. Todas essas vítimas tiveram a liberdade de escolher seus destinos, mas sequer tiveram as condições mínimas de sobrevivência, não possibilitando que derivassem por caminhos melhores. Qual o valor da liberdade desse tipo, então? Fico pensando nessas crianças penduradas nos morros e outras atoladas nos charcos desse país, à mercê de traficantes, bandidos e correlatos, bem como às leis do deus MERCADO. Na morte da criança de 10 anos, fico pensando nela, obviamente, e nesses policiais. Alguns amigos meus chamam a P.M. de "Prontos Para Matar". Eu não sou tão radical, poderíamos chamá-los, também, de "Prontos Para Morrer", pois as desgraças desses eventos tem, sempre, duas mãos de diração. Normalmente, sempre tendemos a ver uma única face de problema. Há duas ou mais. Na síntese, mortos e matadores, estuprados e estupradores, tem a mesma ferida exposta, não na perna pútrida, mas na alma cega. Todos esses atores da tragédia humana são EFEITOS de uma CAUSA, plantada por uma sociedade disforme, apodrecida, uma sociedade que MENDIGA um mínimo de decência e nenhuma moeda cai no seu prato. Não há a mínima esperança, com esse tecido social totalmente esgarçado, destruído. Sem uma verdadeira revolução nada disso mudará. Revolução no sentido clássico: a total reconstrução do Estado, eis que o que aí está, já caiu de podre. O problema é que não temos nem em quem crer para encabeçar um movimento dessa envergadura, nem estrutura política mínima, na qual possamos acreditar. Assim vivemos no pior do mundo. Mas, Bertold Brecht talvez nos dê a fórmula quando diz: " Nada é impossível de Mudar. Desconfie do mais trivial, na aparência singelo. E examinai, sobretudo, o que parece habitual. Suplicamos expressamente: não aceiteis o que é de hábito como coisa natural, pois em tempo de desordem sangrenta, de confusão organizada, de arbitrariedade consciente, de humanidade desumanizada, nada deve parece natural, nada deve parecer impossível de Mudar".


 o MANIFESTo DE LAURO:

 

Lauro Velasco é economista formado pela FEA-USP, mas também é historiador de mão cheia, administrador, educador e auto didata em uma gama de atividades, além de um grande pensador político e social.

 

Nesse espaço iremos abordar assuntos, temas, histórias com um enfoque social e político, mas ao mesmo tempo com uma linguagem simples e fácil de ser entendida e disseminada.

 

E com  esse Manifesto iremos trazer a tona assuntos espinhosos, mas com um tempero bem brasileiro.....

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